Exposição bíblica do salmo 23
1 O Senhor é o meu pastor; de nada terei falta. 2 Em verdes pastagens me faz repousar e me conduz a águas tranquilas;
3 restaura-me o vigor. Guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome. 4 Mesmo quando eu andar por um vale de trevas e morte, não temerei perigo algum, pois tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me protegem.
5 Preparas um banquete para mim à vista dos meus inimigos. Tu me honras, ungindo a minha cabeça com óleo e fazendo transbordar o meu cálice.
6 Sei que a bondade e a fidelidade me acompanharão todos os dias da minha vida, e voltarei à casa do Senhor enquanto eu viver.
Esse é o meu 11º dia em quarentena e muitas pessoas estão confinadas há mais tempo. São dias que não esperava viver. Enquanto me esforço para cumprir minha missão, mesmo em casa, me assustam os disparates que ouço ou leio, de todos os lados, de diferentes pessoas, e de diversas formas. Vejo que a COVID-19 nos surpreendeu em um individualismo extremo. Cada um diz o que pensa, mas isso não lhes serve de âncora, são arrastados pelas mentiras que produzem tentando guiar a si mesmos. Por isso, quase desisto de falar. A desconexão relacional é um problema muito maior do que essa suspeita pandemia. Infelizmente, mesmo a Igreja é severamente afetada por ela. Os crentes minimizaram a separação sob o falso conceito de que cada um é a Igreja. E esse é apenas um exemplo do engano a que vamos isolados.
Desde ontem, porém, tenho ouvido uma Palavra de Deus, e agora quero compartilhá-la com você. Não é o que eu penso, nem o que algum intelectual acha; certamente não é algo que a televisão noticiará. Essa é a exposição de um texto bíblico inspirado por Deus. Se você o ouvir, encontrará um caminho firme e direto para a sua vida, mesmo nesses dias de tanta incerteza.
[V] Veja a Palavra de Deus
A tradição judaica atribui o salmo 23 a Davi. Em algumas Bíblias você o encontra sob o número 22. Pensar que o rei salmista foi um dedicado pastor de ovelhas e, muito mais, saber da intimidade que ele tinha com Deus, faz pensar que ele pode mesmo ser o autor desse que é um dos mais conhecidos cânticos do saltério. Davi o teria composto por causa da experiência de estar em um abrigo quando era perseguido por algum inimigo. Podemos imaginar, mas esse cenário tradicional não deve tirar nossa atenção da profundidade do texto bíblico.
- 1. Como o autor vê a sua própria vida? 1 O Senhor é o meu pastor; de nada terei falta. 2 Em verdes pastagens me faz repousar e me conduz a águas tranquilas, o autor vê sua vida, do presente até o fim (enquanto eu viver v 6) em relação a Jeová: 1. O Senhor é o meu pastor; ele é o pastor e o autor é a ovelha, ele é o dono e o autor é sua propriedade; ele é o centro está ao lado dele. A consequência direta dessa visão é 1.1. de nada terei falta, literalmente, ‘não terei falhas’, ou ‘eu não falharei’. Para explicar por que vê assim a sua vida o salmista cita dois conceitos associados à figura do pastor, palavra que indica o cuidador das ovelhas: 1.1.1. Em verdes pastagens me faz repousar; 1.1.2. e me conduz a águas tranquilas. Ele não diz que está sempre em verdes pastagens, ou pastos novos, não diz que está sempre ao lado de águas tranquilas, mas que está sendo levado para lá, porque essa é a natureza e o trabalho de um pastor. Jeová não seria um pastor se não estivesse levando o autor para uma melhor situação; seu propósito e ação são inseparáveis, portanto, não haverá falta ou falha!
- 2. Como o autor sabe que, sendo uma ovelha de Jeová, não falhará em situações difíceis? 3 restaura-me o vigor. Guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome. 4 Mesmo quando eu andar por um vale de trevas e morte, não temerei perigo algum, pois tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me protegem. 2. O autor aponta para duas atitudes do pastor. 2.1. restaura-me o vigor, esta expressão poderia ser traduzida literalmente como ‘converte a minha vida’, já que o termo hb. shub significa retornar, mudar de direção, e o hb. nephesh significa alma, no sentido da vida como um todo. 2.2. Guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome, justiça significa ‘retidão’, o caminho correto, e o pastor guia a ovelha por esse caminho ‘em resposta’ ou por causa do nome dele, por quem ele é – o pastor é justo e, portanto, guia a ovelha pelo caminho correto. Sabendo dessas duas coisas, o autor olha para o futuro com confiança, 2.2.1. Mesmo quando eu andar por um vale de trevas e morte, não temerei perigo algum, o termo hb. tsalmaveth combina as palavras sombra e morte, podendo sugerir, ‘trevas e morte’, como na NVI, ou ‘sombra da morte’, como na ARC, ou as interpretações da NTLH, ‘escuro como a morte’, e da NVT, ‘escuro vale da morte’; a ideia geral é de um lugar triplamente perigoso, um vale, lugar de emboscadas e armadilhas, escuro e mortal; mesmo em um lugar assim o autor não temeria, ou não reverenciaria o mal ou o maligno. Ele apresenta duas razões para não temer, ou reverenciar o mal: a) pois tu estás comigo; a presença do pastor é mais temível ou reverenciável do que a do mal; b) a tua vara e o teu cajado me protegem, a vara como instrumento de disciplina e o cajado para o apoio, igualmente ‘têm pena’ da ovelha, dai a interpretação de ‘consolar’ da ARC, e a reinterpretação de ‘proteger’ da NVI.
- 3. Como o autor sabe que, sendo uma ovelha de Jeová, não falhará diante dos opressores? 5 Preparas um banquete para mim à vista dos meus inimigos. Tu me honras, ungindo a minha cabeça com óleo e fazendo transbordar o meu cálice. 3. Alguns comentaristas veem aqui uma mudança de figura, do pastor e da ovelha para um anfitrião e seu hóspede. Embora pastor e ovelha não sejam mais mencionados, os versos 5 e 6 podem ser vistos facilmente como uma figura na figura. Assim, o autor apresenta 3 razões para não falhar diante de opressores. Novamente, todas as razões dependem das ações do pastor. 3.1. Preparas um banquete para mim à vista dos meus inimigos, por causa do pastor, a ovelha pode pastar segura, mesmo diante de opressores. 3.2. Tu me honras, ungindo a minha cabeça com óleo, ‘Tu me honras’ é um acréscimo interpretativo da NVI; embora derramar óleo perfumado sobre a cabeça de alguém fosse sinal de muita honra, o azeite podia ser usado sobre a cabeça das ovelhas para evitar o incômodo dos insetos. 3.3. e fazendo transbordar o meu cálice, o substantivo hb revayah significa saturação, o copo é completamente cheio, existe satisfação; no caso das ovelhas, isso poderia significar um bebedouro com água corrente, onde não haveria falta mesmo quando outros bebessem.
- 4. Como o autor sabe que, sendo uma ovelha de Jeová, não falhará com o passar do tempo? 6 Sei que a bondade e a fidelidade me acompanharão todos os dias da minha vida, e voltarei à casa do Senhor enquanto eu viver. 4. O salmista começa esse parágrafo com o advérbio hb. ak que significa ‘certamente’. Ele não tem dúvida sobre duas coisas para os tempos que virão. 4.1. Sei que a bondade e a fidelidade me acompanharão todos os dias da minha vida, ‘acompanhar’ soa como uma atitude passiva e submissa, mas o termo hb. radaph tem o forte sentido de ‘perseguir’, o autor sabe que será ‘perseguido’ pela ‘bondade (hb. towb) e ainda mais por sua benignidade (hb. checed)’; veja que, como a vara e o cajado se referiram às ações do pastor, a bondade e a benignidade se referem ao seu caráter; o pastor Jeová faz coisas boas e ainda mais, tem boa disposição para as continuar fazendo enquanto ‘persegue’ sua ovelha. 4.2. e voltarei à casa do Senhor enquanto eu viver, enquanto ‘persegue’ suas ovelhas, costumeiramente nas estações quentes, sem nunca perde-las, provavelmente nas estações frias, quando seria impossível ficar fora, o pastor leva a ovelha para ‘sentar-se’ em sua casa na continuidade dos dias.
[O] Ouça a Palavra de Deus
Este salmo começa e termina com o santíssimo nome de Jeová. O salmista usa a figura de um pastor e uma ovelha para representar uma relação próxima de cuidado e dependência. Mas o que mais chama a atenção, é que nada nesse salmo se refere ao caráter ou à iniciativa da ovelha. Tudo circula ao redor do pastor, seu caráter e suas ações. Jeová é o pastor e somente ele provê, converte, guia, está, protege, prepara, unge, faz, acompanha. As ações que a ovelha expressa são todas por causa do pastor, em total dependência dele.
É difícil pensar nesse salmo sem ouvir Jesus dizendo: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas” Jo 10:11 e outra vez “Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem” Jo 10:14. Esses versículos estão na passagem de Jo 10:1-21, dominada por figuras relativas ao pastoreio de ovelhas. Nessas duas afirmações pessoais, entre as magníficas afirmações do ‘eu sou’ relatadas por João, Jesus se apresenta como o bom pastor, no lugar de qualquer outro que se pudesse imaginar. Portanto, reivindica o salmo 23.
- 1. Jesus é o bom pastor: nos dois versículos o Senhor usa o termo gr. kalos, que indica a bondade que é percebida, que pode ser vista. Ou seja, ao olhar para Jesus pode-se perceber que ele é bom. Exatamente assim o salmista percebe e entende como será sua vida por causa de quem é o pastor cuja bondade e benignidade percebe.
- 2. Como age o bom pastor: no versículo 11 Jesus repete a expressão ‘bom pastor’, para dizer que ele dispõe sua vida pelas ovelhas. Jesus não disse que dava sua morte (embora também a tenha dado). Dispor a vida (gr. psuché) é dedicar-se totalmente, comprometer todas as preferências, desejos, planos e ações, em favor das ovelhas. Não porque as ovelhas são boas, mas porque o pastor é bom! É assim também que o pastor do salmo 23 age, ele se dispõe totalmente para agir em favor de sua ovelha.
- 3. O bom pastor conhece suas ovelhas: no versículo 14 Jesus relaciona o ser ‘bom pastor’ com conhecer as ovelhas. O verbo usado é o gr. ginóskó, termo que indica o conhecimento, o reconhecimento ou a percepção como resultado da experiência pessoal no relacionamento. Jesus é o bom pastor porque conhece intimamente as suas ovelhas, ele se relaciona com elas, sabe quem são, entende suas aflições e necessidades. Esse conhecimento do pastor para com as ovelhas, e até das ovelhas para com ele, é tão intenso que Jesus usa como exemplo o seu relacionamento com o Pai: “assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai” Jo 10:15.
- 4. As ovelhas conhecem o bom pastor: Jesus usa o mesmo verbo gr. ginóskó para dizer que as ovelhas o conhecem. Portanto, as ovelhas sabem que Jesus é o Bom Pastor por causa do relacionamento que têm com ele, aprendendo suas características por experiência, tal e qual o autor do salmo 23. O salmista soube que não teria falta, não falharia, qualquer que fosse a situação, ou o tempo, isto porque conhecia seu pastor, sabia que ele é bom e ainda mais, é benigno.
[S] Sinta a Palavra de Deus
Já falei algumas vezes sobre a impressão que me causou um anúncio da antiga fábrica de automóveis Gurgel. Para promover um de seus carros atípicos, representaram-no destacando-se em uma fila de ovelhas. Aquela propaganda contou com o senso comum de que é melhor ser diferente e seguir o rebanho é algo negativo. Bem, eu diria que depende do pastor. Se o pastor é bom, quero andar no rebanho dele. Este salmo convida a nos submetermos ao cuidado do divino pastor. Aqui estão quatro ideias para você coloca-lo em prática agora mesmo.
- 1. Para diminuir: “não temerei perigo algum, pois tu estás comigo”. Ao ler esse salmo, somos chamados a não reverenciar o mal ou o que é maligno. Mesmo que estejamos em um vale onde há o risco de ataques surpresa, mesmo na escuridão onde ninguém enxerga o que virá, mesmo cercado pela ameaça de morte, em todas essas situações devemos temer somente ao Senhor, se sabemos que ele está conosco, se percebemos sua presença.
- 2. Para aumentar: “O Senhor é o meu pastor”, tanto no salmo 23 como nos versículos que vimos em João, o relacionamento com o divino pastor é essencial para usufruir as bênçãos que há em ser guiado por ele. Devemos ter um relacionamento muito íntimo com o Bom Pastor, ao ponto de sabermos como será nossa vida até o último de nossos dias na terra. O Senhor Jesus nos prometeu isso: “E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos” Mt 28:20, mas essa valiosa promessa nada significa para nós no vale da sombra da morte, e mesmo nos pastos verdes à beira das águas tranquilas, se não soubermos quem ele é, qual é o seu caráter e qual a sua conduta. Precisamos aumentar nosso conhecimento do Senhor, ouvindo-o falar nas Escrituras, falando com ele na oração, nos enchendo de seu Espírito e convivendo com o corpo dele, a Igreja. Se abundarmos no reconhecimento dele como ‘o bom Pastor’, se realmente pudermos dizer ‘O Senhor é o meu pastor’, não falharemos.
- 3. Para repartir: “restaura-me o vigor”, essa expressão me impressionou profundamente enquanto estudava esse texto. Literalmente, ela significa ‘ele converte a minha alma’. Esse testemunho que pode ter mais de 2.000 anos ainda tocou a minha vida hoje e, no meio das minhas aflições, me fez desejar que o Bom Pastor continue convertendo a minha alma. Eu sei que ele o fará por mim, porque é bom! Mas isso me traz a responsabilidade de testemunhar a outros, para que também sejam convertidos de suas angústias, tristezas, medos e de toda a destruição. Por isso preparei essa mensagem, para que outros também saibam. Então convido você a fazer o mesmo. Quando o Senhor Jesus for o seu pastor, quando ele estiver guiando a sua vida, conte isso a outras pessoas, para que não reverenciem mais aquilo que é mal, para que não se curvem ao que é maligno, mas saibam que o Bom Pastor está com elas.
- 4. Para multiplicar: “Sei que a bondade e a fidelidade me acompanharão todos os dias da minha vida”, a nossa missão não é fazer boas pregações, produzir ótimos vídeos, imprimir literatura colorida, ou simplesmente pregar nos púlpitos e nas praças. A nossa missão não é atrair as pessoas com música e teatro, e agradá-las para que fiquem na Igreja. O Bom Pastor quer perseguir as pessoas para que não se percam, ele quer submetê-las à sua benignidade, como ele mesmo disse: “… É necessário que eu as conduza também. Elas ouvirão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor” Jo 10:16. Quando ensinarmos, pregarmos, testemunharmos ou aconselharmos, as pessoas devem desejar se submeter ao governo do divino pastor.
Seja essa a nossa oração: “Dominus reget me”, o Senhor me guiará!